sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Controle e Controvérsia :: Parte I

Da série de contos "Diários em terceira pessoa"
Uma tentativa de literatura. Por que nenhum deles é real. E nenhum deles é fictício.


Algumas pessoas diziam que ele tinha poderes mágicos. Uns achavam maravilhoso o seu "dom", outros achavam tudo um completo absurdo; uns morriam de inveja, outros diziam que aquilo não era nada demais; uns o admiravam por completo, outros o repudiavam com toda força que pudessem. Ele nem sempre entendia bem o que era tudo aquilo, e era tudo tão normal, tão natural na sua rotina que ele simplesmente não se incomodava...

Mas a verdade é ninguém conseguia ficar indiferente àquele garoto. Todos, todas sabiam que ele tinha algo de diferente, intrigante...

Ele dominava quase que completamente os "alvos" dos seus sentimentos...


Todas as pessoas ao seu redor - e ele conseguia observar isso com perfeição - tinham sentimentos completamente "dependentes" das outras pessoas, sentimentos determinados pelo que lhes acontecia ao redor: a sua colega de classe andava revoltada, e era por causa de uma amiga que lhe havia feito algo de desagradável; sua mãe andava chateada, por causa de seu pai, que havia lhe negado uma lua de mel fora de época; sua melhor amiga andava louca de desejo, por causa de um garoto da faculdade, com quem tinha tido a melhor transa de sua vida...

Mas com ele era diferente. Ele apenas sentia. Se estivesse revoltado, chateado ou com desejo, seria apenas isso.
Não seria nada em função de ninguém. Nada por ninguém. Nada por causa de ninguém.

Havia dias em que ele simplesmente acordava alegre. Sem motivo, sem razão de ser. Outros dias, saía da cama com um ódio mortal que não conseguia explicar. Amigos perguntavam se estava com vontade de bater em alguém, e ele apenas pensava que ninguém tinha nada a ver com aquilo. Seria mais próprio ele dizer que estava com vontade de bater. Só.

Houveram várias épocas em que ele se pegou perdidamente apaixonado, por exemplo. Por quem? Por ninguém. Estava apaixonado, apenas. Tomado por todas as mesmas sensações e vontades de qualquer outro apaixonado, às vezes mais fortes, a ponto de ficar piegas como o personagem mais piegas da história romântica mais piegas... músicas amorosas, versinhos em pedaços de papel, sorrisos deslumbrados olhando para o tempo... Qualquer um notava. Mas se o perguntassem quem era o alvo de tanto amor, ele prontamente respondia, no meio de um sorriso abobalhado:

- Ninguém. Acho que não sei ainda... - e suspirava descuidadosamente, como se aquilo fosse a coisa mais natural do universo.

Por vezes se sentia egoísta - e as pessoas o acusavam disso também. Havia muito, andava pensando se as pessoas não estariam realmente certas em dizer que era muito esquisito aquilo de sentir tanta coisa por ninguém. Até chegar o dia em que ele descobriu que as coisas não eram tão assim. Na verdade, lhe pareciam ficar cada vez mais estranhas. Mas egoísta, ele poderia não ser. Foi no meio de suas reflexões - não necessariamente por causa delas - que, sem mais nem porquê, ele descobriu algo de que ainda não tinha se dado conta: era capaz de controlar os alvos de seus sentimentos...

Ia pensando: as outras pessoas não controlavam nada do que sentiam - e o que sentiam era geralmente o que as outras pessoas lhes provocavam. Com ele era diferente, pelo menos em alguma coisa: apesar de também não controlar exatamente o que sentia, os seus sentimentos não eram dependentes dos outros, a não ser que ele quisesse que o fossem. "Não escolho estar apaixonado, ou com raiva, ou chateado, ou com desejo. Apenas acordo assim, e não tenho opção. Mas é como se eu pudesse escolher pessoas a quem direcionar estas sensações", pensou ele. E achou aquilo fantástico, apesar de tão insólito... Imaginou, por exemplo, que quando lhe aparecesse uma raiva ensandecida de repente, ajustaria o coração para sentir raiva de alguém que lhe desse motivo para tal. Quando estivesse naquelas épocas perdidamente apaixonadas, podia escolher como alvo daquele amor alguém que também o amasse - afinal, todos falavam das maravilhas de um amor correspondido...

Pensou que seria uma excelente alternativa, especialmente para fazer com que as outras pessoas não tivessem mais motivos para dizer que os seus sentimentos eram egoístas.
Achou que assim seria feliz... e resolveu investir na sua lógica...

Para a sua decepção, não foi sempre que as coisas deram certo... primeiro, porque começou a perceber que os seus sentimentos, por mais que pudessem ser direcionados a diferentes pessoas, lhe vinham um de cada vez. Por uns tempos em que acordou amoroso, por exemplo, resolveu namorar um garoto que havia se declarado para ele havia um tempo. E foram duas semanas de coisas lindas, e de um sentimento carregado de beleza e de sinceridade. Até o dia em que acordou entediado. Primeira decisão que tomou foi a de não direcionar o seu tédio ao namorado, mas a qualquer outra pessoa, para dar um prosseguimento saudável à relação. Até que se deu conta de que, com o surgimento do tédio, o amor de antes sumira. Sem paixão, sem querer, sem vontade, não adiantava muito tentar seguir. Com toda sensatez, pensou que sequer seria justo fazer o menino esperar que o amor voltasse, sem sabem em quanto tempo voltaria, sem saber quanto tempo duraria quando voltasse...

As crises que lhe bateram foram muitas, e ia cada vez mais descobrindo que construir relações era sempre muito desafiador...

Porém, os desafios das relações não lhe pareciam tão grandes quanto era a estranheza de simplesmente não se relacionar - todas as outras pessoas tinham laços, ele nunca construiria? E foi dando as chances...

Um dia, acordou afetado por uma energia sexual que não explicava. Já sabia havia tempos que aqueles dias eram dos extremos: acabavam sempre muito agradáveis, ou completamente desagradáveis. Ao menos, ele também sabia, aquele não era um sentimento que costumava durar muito. Um dia, dois, no máximo. Em breve iria passar.

Saiu para uma festa meio por acaso, e meio por outro acaso achou a quem direcionar o desejo. Um cara lindo, exalando charme, que olhou para ele engraçado e pareceu querer alguma coisa. Sensações decididas, aproveitou a companhia e entre conversas agradáveis, sorrisos, olhares, afinidades, beijos e apertos trocados, e o resultado de tudo foi uma maravilhosa noite - na casa do tal rapaz...

***

Quer saber como essa história continua?
É só dar dar um pulo na segunda parte do Controle e Controvérsia...
  

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